Democracia,
racismo e inovação
Por Cristian Welsh Miguens, CMC
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Tempos estranhos que estamos vivendo hoje em dia!
Ter que lidar com uma pandemia e seus efeitos prejudiciais parece não ser
suficiente, agora temos que nos acostumar também à agitação social.
O fato de comícios recentes e manifestações públicas se transformarem
facilmente em uma turba não é o motivo que mais chamou a minha atenção pois
isto pode ser esperado quando houver um verdadeiro descontentamento
generalizado. Também não foram seus
supostos propósitos e ideais visto que a maioria de nós os apoiaria. O
problema são as suas propostas, porque não tratam do problema, simplesmente
apontam para alguém para ser culpado e depois punido e / ou exigem privilégios
para si mesmos, negando-os àqueles aos quais se opõem no momento.
Aqueles que afirmam defender a democracia e seus princípios
propõem medidas antidemocráticas, principalmente reduzindo as
liberdades. Aqueles que afirmam estar combatendo o racismo, a intolerância
e a discriminação, simplesmente propõem que os privilégios que caracterizam
tais situações mudem de mãos, sem entender que estão tornando-se tão racistas,
intolerantes e discriminatórios quanto aqueles aos quais se opõem, mas com
sinal oposto.
Poderíamos discutir as consequências de tal comportamento sob
um ponto de vista sociológico, psicológico ou ideológico. Este não é o
lugar para fazê-lo, embora considero que deveria haver mais conteúdo público
sendo produzido sobre esses assuntos. Minha proposta é analisar esse
fenômeno à luz da gestão de negócios e da promoção de melhores práticas em
gestão de negócios e nos ambientes de influência destes, melhorando a geração
de valor, a melhoria da produtividade, o desenvolvimento social e econômico, em
suma, promovendo o progresso.
Usando o livro de Andrés Oppenheimer “Innovate or
Die! : How to Reinvent Yourself and Thrive in the INNOVATION Age” (edição
em inglês) ou “Como se reinventar e prosperar na era da inovação” e sua
conclusão como referência, ele afirma que, embora a inovação seja uma
questão-chave para o desenvolvimento e aprimoramento social futuros, ela está
intimamente ligada e é produzida principalmente em ambientes que de alguma
forma apoiam e estimulam a diversidade.
Para começar, a criação de ambientes que estimulam a
diversidade é o oposto de promover uma mudança de privilégios de um lado para o
outro. Tem a ver com a eliminação de privilégios e com ações e controles
que previnam a reinstalação dos mesmos, não apenas através de regulamentos,
leis, projetos de lei ou qualquer outro instrumento, mas através de ações e
exemplos reais, especialmente daqueles “influenciadores” (em linguagem de
gerenciamento, líderes) que são valorizados, admirados e seguidos .
A segunda questão a ser levada em consideração é o que Moisés
Naím, autor e editor de artigos venezuelano, escreveu em seu livro “The End
of Power: From Boardrooms to Battlefields and Churches to States, Why Being In
Charge Isn't What It Used to Be” ou “ O
Fim do Poder: desde os Conselhos de Administração até o chão de fábrica e desde
as igrejas até os Estados, por que estar no comando não é o que costumava ser ”,
em 2013. O poder e a forma em que ele é usado são essenciais ao considerar o
processo de tomada de decisão que leva a uma ação proativa. O que Naím
tenta mostrar é que, embora pessoas e instituições poderosas, ou pelo menos
aquelas amplamente aceitas como tendo esse poder, continuem tendo muito poder,
a internet e as mídias sociais estão causando uma redistribuição de poder,
reduzindo lenta mas sistematicamente o poder real mantido nas mãos daqueles que
ainda percebemos como poderosos. Isso também é verdade dentro das
empresas.
A terceira e última questão que gostaria de considerar neste
artigo é o que é que empresários e consultores devem fazer para promover a
inovação e o progresso nas organizações. À luz do que escrevi acima,
deveria ser encontrar meios de criar ambientes nos quais a diversidade
desempenha um papel principal. Apoiar esses ambientes e seu
desenvolvimento é uma tarefa extremamente difícil.
Embora a digitalização, uma agenda presente nas organizações
há pelo menos cinco anos, já estivesse em andamento, descentralizando a tomada
de decisões, aproximando clientes, outras partes interessadas e organizações,
nenhuma das soluções propostas aborda especificamente a necessidade de criar um
ambiente de diversidade dentro delas.
Algumas pessoas podem dizer que é tarde demais, que criar
esses ambientes não apenas não é suficiente, mas que também aumentará a quantidade
de conflitos e a agitação social. Eles argumentarão apontando para o fato
de que é inútil que as pessoas se envolvam em discussões simplesmente porque as
pessoas não têm a mente o suficientemente aberta como para poder mudar de ideia. Eles
também apontam para o fato de que hoje em dia as pessoas se reúnem apenas com
pessoas que pensam igual a elas mesmas e que esse comportamento criou uma
polarização real na sociedade. Eu ainda acredito que esses fatos não são
definitivos.
Para criar ambientes que abracem a diversidade, onde a
discussão e os argumentos contrastantes seriam a regra, é necessária uma
mudança nas atitudes das pessoas. Não apenas o respeito à opinião um do
outro deve ser estimulado, ele também deve ser protegido; educar as
pessoas a entenderem que a opinião não é apenas o que cada um gosta, mas que deve
basear-se em conhecimento e pesquisa; discussões consomem tempo, então o
tempo gasto em discussões deve ser tolerado; um debate tem regras - as
pessoas devem ser educadas sobre essas regras, nunca permitindo que uma
discussão se desvie para ataques pessoais; surgirão divergências - os
líderes da organização devem estabelecer regras para lidar com tais
divergências; os líderes perderão poder - eles devem se perguntar se estão
prontos para ceder esse poder; por último mas não menos importante, chegar
a um consenso não é o objetivo -
fazer uma maioria dentro de certa quantidade de pessoas não significa que eles
estarão sempre certos, então, quais serão os instrumentos e regras a ser usados
para orientar as discussões e a tomada de decisão final?
Argumentar constantemente também não é o jeito certo para se
lidar com questões e tarefas específicas. Isso significa que, em algum
momento durante uma discussão, alguém poderá intervir e fazer com que a equipe
aceite uma decisão final e comece a trabalhar no problema. Essa cultura
não será alcançada imediatamente. É um processo de desenvolvimento e
construção de confiança dentro da equipe.
Outra questão a ser abordada é como a melhoria será
medida? Deve ser medido de alguma forma.
Em um mundo complexo, a inovação fará a diferença. A
inovação, para acontecer, precisa de ambientes que abracem a diversidade, com
regras para disciplinar as interações e o engajamento das pessoas. A hierarquia
e a autoridade como instrumento exclusivo de tomada de decisão não são mais
suficientemente eficazes por si só. Ainda não temos um acordo geral sobre
um novo modelo para substituí-lo, o que significa que será necessário criar
novos modelos. A mudança hoje em dia tornou-se uma necessidade.
Os consultores devem engajar-se nesse esforço. Os
consultores têm chances de experimentar novas soluções. Os consultores têm
oportunidades e habilidades específicas para fazer a diferença e transformar as
organizações para, depois, transformar a sociedade. Espero que possamos vivenciar
esse desafio.